Em entrevista concedida no dia 16 de julho de 2025 ao canal Agro & Prosa, o professor Leonardo Fraceto, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Nanotecnologia para a Agricultura Sustentável (INCT Nano Agro), falou sobre os avanços científicos que estão tornando a agricultura brasileira mais eficiente, segura e conectada com as demandas da sustentabilidade. Durante a conversa, o professor Leonardo contou ainda como aconteceu a criação do INCT e explicou a importância das parcerias para o escalonamento dessas tecnologias.
Trouxemos um resumo dessa conversa para você:
O que é um INCT?
Os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) são uma iniciativa do Governo Federal voltada ao fomento de pesquisas estratégicas para o país, como saúde, agricultura, energia, meio ambiente, entre outras. Esses institutos são criados por meio de chamadas públicas promovidas por órgãos como CNPq, CAPES, MCTI e FAPs e reúnem redes de pesquisadores de diferentes instituições e regiões para desenvolver ciência de ponta, por meio de projetos que apresentem impacto direto na sociedade e na economia.
Como surgiu o INCT Nano Agro
O INCT Nano Agro nasceu da atuação de um grupo de pesquisadores de diferentes regiões que já realizavam pesquisas em colaboração dentro do tema da nanotecnologia e da sustentabilidade na agricultura. Com a criação do instituto, foi possível consolidar essa rede em um projeto institucional e nacional, agregando novos especialistas e ampliando a capacidade de atuação. A proposta foi aprovada em um edital federal que exigia, entre outros critérios, a articulação de cientistas de pelo menos três regiões do Brasil. A rede de pesquisadores do INCT NanoAgro está localizada no sul, sudeste e centro-oeste.
Além da diversidade geográfica, o INCT conta com a parceria de empresas para escalonamento de pesquisas e apoia startups de pesquisadores ligados à rede, visando promover a transferência da tecnologia para a sociedade e a geração de impacto positivo no setor. Graças ao viés de aplicação das tecnologias, hoje o INCT conta com um portfólio promissor de soluções com potencial de moldar o futuro do agronegócio brasileiro.
Vamos conhecê-las a seguir.
1. Nanopartículas para reduzir o uso de agrotóxicos
Uma das linhas centrais de pesquisa do INCT é a criação de nanopartículas para otimizar a aplicação de defensivos agrícolas. Essa otimização ocorre por meio de sistemas de liberação sustentada, no qual as nanopartículas funcionam como “carrinhos” que entregam o defensivo agrícola de forma super localizada e prolongada. Dessa forma, os insumos que estão dentro das nanocápsulas (que podem ser sintéticos do mercado ou à base de componentes naturais) se tornam mais estáveis e mais eficazes, mesmo em doses muito menores.
As nanocápsulas também protegem os ativos agrícolas da degradação no meio ambiente, o que permite que a criação de novos ingredientes seja tecnicamente viabilizada, especialmente os no caso dos bioinsumos. Isso representa um grande avanço para o Brasil, que já é o maior consumidor de bioinsumos agrícolas do mundo.
As formulações contendo essas nanopartículas estão sendo desenvolvidas para diferentes funções e métodos de aplicação, como herbicidas, inseticidas e estimulantes de crescimento, de aplicação foliar, diretamente no solo ou no tratamento de sementes. Já tivemos projetos que reduziram em 80x a concentração atrazina gerando a mesma eficácia que a formulação convencional para a cultura do milho.
Além da redução da concentração, os sistemas nanomoleculares podem ajudar a vencer um grande desafio da indústria de defensivos agrícolas em todo o mundo: o aumento da resistência das pragas aos princípios ativos. A tecnologia desenvolvida por pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria usa a nanotecnologia em formulações de alto desempenho capazes de recuperar a eficácia de substâncias amplamente difundidas no mercado para o controle de insetos.
Além de diversas pesquisas para otimizar o desempenho e a entrega de moléculas convencionais do mercado, os pesquisadores do INCT possuem pesquisas e patentes depositadas para métodos e moléculas de biocontrole, como o caso das pesquisas do professor Ricardo Polanckzyk e da professora Renata Lima.
2. Tecnologias para mitigar o estresse hídrico
Outra inovação promissora são as nanopartículas com hormônios vegetais, utilizadas no tratamento de sementes. Isso melhora a germinação e o desenvolvimento das raízes, aumentando a resistência da planta à seca — uma vantagem importante em cenários de seca e mudanças climáticas. Já foram realizados diversos testes para as culturas de soja, milho e tomate, tanto em laboratório, como em casas de vegetação e em campo.
Na Universidade Estadual de Londrina, o professor Halley Caixeta, vice-coordenador do INCT, lidera essa temática, estudando, entre outras soluções, o uso do óxido nítrico no tratamento de mudas e sementes. Em parceria com a professora Amedea Seabra, da Universidade Federal do ABC, estão sendo escalonados os testes das soluções mais promissoras. Os pesquisadores contam também com uma patente depositada.
Além da aplicação na agricultura, o tratamento de sementes está sendo estudado pelo professor Halley com o foco em projetos de reflorestamento da Mata Atlântica.
3. Tecnologia para retardar o amadurecimento de frutas
Outra solução que já recebeu destaque em diversos veículos, incluindo a Revista Superinteressante, é a tecnologia que retarda o amadurecimento de frutos. Em regiões tropicais, esse é um desafio que compromete o escoamento da produção.
No projeto liderado pela professora Amedea Seabra, da Universidade Federal do ABC, foram desenvolvidas nanopartículas capazes de prolongar a vida útil dos frutos. A formulação atua reduzindo a produção de etileno, gás responsável pelo amadurecimento das frutas, funcionando como antioxidante e melhorando a firmeza e aparência dos alimentos.
As frutas são imersas ou pulverizadas com as nanopartículas e, após o tratamento, já estão prontas para o armazenamento, simplificando o processo de transporte e distribuição sem depender de refrigeração. A tecnologia está patenteada, encontra-se em fase de testes e busca parceiros para chegar ao mercado.
4. Nariz eletrônico para detecção de pragas
Inspirado em sensores biomiméticos, o chamado nariz eletrônico identifica moléculas sinalizadoras liberadas pelas pragas com o objetivo de detectar e antecipar infestações, permitindo o manejo localizado e eficiente.
A tecnologia já foi testada com percevejos. Os biosensores que compõem a solução foram capazes de detectar os feromônios de acasalamento, permitindo antecipar e prevenir a reprodução do inseto que causa enormes perdas para a nossa agricultura.
Essa tecnologia foi desenvolvida pelas pesquisadoras Juliana Steffens e Clarice Steffens, da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, e se alinha aos princípios da agricultura de precisão.
O projeto está em fase de protótipo e abre possibilidades para uso embarcado em drones, com mapeamento inteligente de áreas agrícolas.
5. Aproveitamento de resíduos industriais
O INCT possui diversas tecnologias que se baseiam nas premissas da economia circular, ou seja: transformando resíduos e subprodutos da indústria em produtos de valor. Essas matérias-primas são usadas no desenvolvimento de novos materiais e sistemas de nanoencapsulação.
Um desses projetos usa a lignina kraft, subproduto da indústria papeleira, para fabricar nanopartículas com ingredientes ativos para o agro. O processo de obtenção da lignina foi patenteado e já é usado em diferentes desdobramentos, como esse método de mulching (“cobertura do solo”, em tradução literal), que otimiza a absorção de água e a liberação de fertilizantes por meio de uma cobertura de termoplásticos biodegradáveis.
Outros projetos que envolvem o aproveitamento de resíduos são o NanoCarbono 480, que utiliza matéria orgânica da rede de esgoto para síntese de um material capaz de potencializar a fotossíntese das plantas, e a síntese verde de sílica a partir da casca de arroz.
6. Estimulante de Crescimento que atua diretamente na fotossíntese
Desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal do Mato Grosso, o NanoCarbono 480 é capaz de converter a radiação ultravioleta em luz azul, aumentando a eficiência da fotossíntese, o que consequentemente estimula o crescimento das plantas.
A tecnologia, também patenteada, já foi testada em diversas culturas e apresentou um potencial de mercado significativo para a recuperação de pastagens degradadas. Com o uso da tecnologia, é possível recuperar pastos e evitar desmatamento para ampliação da pecuária.
Da ciência ao campo: o papel das parcerias
Com tantas pesquisas promissoras, os cientistas do INCT não perdem de vista um de seus principais objetivos: promover a transferência do conhecimento para a sociedade. Diversos pesquisadores do INCT são, também, empreendedores e buscam levar os produtos criados a partir dessas tecnologias ao mercado. Além disso, os laboratórios que compõem a rede do INCT têm um bom histórico de parcerias com indústrias para escalonamento de testes e avanço de maturidade tecnológica.
Essas parcerias com o setor produtivo são fundamentais para que as tecnologias cheguem aos agricultores, já que a universidade e as instituições de pesquisa não operam diretamente a produção em larga escala.
A nanotecnologia no Brasil
Mesmo com restrições orçamentárias, o Brasil ocupa uma posição de destaque na pesquisa em nanotecnologia agrícola. “Temos produtores curiosos, cientistas muito competentes e uma agricultura altamente tecnológica”, afirmou Fraceto. Já existem no mercado nacional produtos nanotecnológicos, especialmente voltados à bioestimulação de plantas. Atualmente, as tecnologias de controle (como pesticidas nanoestruturados) demandam regulamentações mais complexas. Mesmo assim, há expectativa de crescimento nos próximos anos. A entrevista completa pode ser assistida no canal Agro & Prosa, com o título “Agricultura ganha eficiência com nanotecnologia brasileira”.
E se você quer saber como levar essas tecnologias para a indústria ou para o campo, o INCT possui um setor de Inovação atuante na prospecção de parcerias. Não deixe de entrar em contato pela página de parcerias. Nosso formulário de prospecção encontra-se constantemente ativo e é avaliado e respondido diariamente pelo setor de Inovação.







